Fechamento do Cine Roxy: saída honrosa é possível

Se o prefeito Eduardo Paes ler este texto, peço que o leia como uma carta. Não a endereçaria ao governador do Rio, pois quem está ao lado de Bolsonaro está de costas para a cultura… Há saída.

Eu nunca botei meus pés dentro do Cine Roxy de Copacabana. Não sou carioca, e quando estou no Rio tudo o que menos quero é estar num cinema. Cinema é para usufruto dos cidadãos da própria cidade, do próprio bairro, não para quem está fazendo turismo ou a trabalho. Mas minha cidade natal abriga um Roxy ainda mais antigo que o de Copacabana, que também sofre os efeitos da pandemia. Mas este texto não vai comparar as estratégias empresariais adotadas pelas empresas que controlam os Roxys – a de Santos (fundada em 1934) é a Roxy Cinemas; a do Rio (inaugurada em 1938) é o grupo Severiano Ribeiro. A ideia, aqui, é falar sobre patrimônio histórico, artístico, cultural, afetivo, material e imaterial. E sobre como há saída para a crise. Sem meias palavras: o local já é tombado, desde 2003, como patrimônio material. Quem o comprar, não poderá alterar fachada, letreiro, boa parte das salas… Então que tal pensar em desapropriação?

“Aaah, mas estão pedindo R$30 milhões!”. Negocie… E, bom, se o governo do DF “pagou” R$4 milhões para a escola de samba Vila Isabel mostrar a história de Brasília na Sapucaí, não deve ser tãão difícil arrumar os R$30 mi… (ou: fala com tio Ibaneis, ele é rico, inclusive se elegeu dizendo que botaria dinheiro do bolso dele pra resolver os problemas de Brasília… ok, isso foi só ironia mesmo)

Não é uma ideia original, nem irreal

Pode ser que, a essa altura, olhos estejam virados para cima, lendo este texto como se fosse a coisa mais pretensiosa do mundo, e como se eu estivesse reivindicando originalidade sobre a proposta. Tô não. Tô só me baseando em ações semelhantes. Quer ver? Em 2014, fui a Santos (SP), a trabalho, para ancorar a transmissão do 3º Santos Jazz Festival para a Rádio Nacional FM de Brasília. A noite estava bastante chuvosa e os shows da abertura, que seriam ao ar livre, foram transferidos para o Teatro Coliseu, no centro da cidade. Quando me dei conta de que estava diante de uma joia do Ciclo do Café, fundada em 1909, senti que estava em pecado: como não havia conhecido? Verdade que saí da cidade bem jovem, mas enquanto lá vivi, fui rato de teatro. Segue a história:

“Entre 1976 e 1998, o Teatro Coliseu teve inúmeros outros usos. Entre eles, abrigou um cinema pornográfico, uma drogaria e um restaurante. No final da década de 1990, esteve prestes a ser demolido para dar lugar a um estacionamento, quando o poder público declarou o edifício como patrimônio histórico e a utilidade pública do local – hoje, pertencente à prefeitura de Santos (SP)”, conta a produtora do Coliseu, Naiá Gago.

Hoje restaurado, o local tem capacidade de público de 1100 lugares. Um luxuoso foyer, com detalhes arquitetônicos em pedra sabão, e uma sala de Câmara de cerca de 250 metros quadrados, repleta de afrescos originais e colunas francesas refletem a estética de uma época em que a arte era acessível apenas às elites, então moradoras do centro de Santos. Hoje, quase não se veem palacetes na região, substituídos ao longo das décadas por outras construções.

“Alguns anos antes, outro teatro, bem menor, foi construído também aqui no centro histórico. É o Teatro Guarani, que teve a mesma história que o Coliseu: esteve abandonado, virou cinema pornográfico e quase foi demolido. Logo que foi ‘resgatado’ pelo poder público, pegou fogo e hoje apenas sua fachada é da época, o interior teve o restauro impossibilitado”, diz Naiá. “Então apenas o Coliseu, que passou e ainda passa por restauração, nos dá a possibilidade de conhecermos esta história”.

A história toda está bem aqui

A entrevista foi com o teatro prestes a completar 90 anos, e tá aqui:

O caso Belas Artes

Há 10 anos, algo parecido foi vivido em São Paulo, com o anúncio de que o Cine Belas Artes, tradicionalíssimo, de rua, na Consolação, seria encerrado. Houve imensa mobilização, gritaria e chororô muito bem-vindos. Resultado: formou-se uma frente para evitar o fechamento, uma nova empresa se entusiasmou, rolou uma reforma por três anos e ele reabriu, lindão, pronto pra ostentar isso aqui:

Tá demonstrado, portanto, que rola de buscar uma solução, não tá? Bom, vale dar uma lida nessa matéria aqui, do G1, em que o Haddad, então prefeito de São Paulo, fala sobre desapropriação de outros cinemas – uma forma de resgatar a “Cinelândia Paulista” (detalhe: me hospedei no Plaza Hotel em 2008 e o Cine Art Palácio, que aparece com destaque neste texto, estava transformado em… cinema pornô).

Luz no fim do túnel?

Fiz contato com a assessoria do grupo Kinoplex (o Severiano Ribeiro) pra saber as informações e detalhes oficiais sobre o encerramento do Roxy. Disseram que não confirmavam o fechamento definitivo, nem tinham posicionamento oficial ainda. Não parece mentira o que a imprensa, especialmente a carioca, especialmente o Ancelmo Góis, publicou nestes últimos dias. Mas… será que o próprio grupo tem pensado num jeito de evitar o encerramento do Roxy? A ver. De todo modo, as ideias estão aí…

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