
Morillo Carvalho
Ele só tinha 36: que isso sirva de aviso pra vocês. Nos deixou em 11 de outubro de 1996, mas se estivesse vivo, hoje estaria aniversariando seus 50 anos, assim como Brasília, daqui a 25 dias. Pois é. Menos de um mês depois do nascimento de Renato Russo, a cidade que serviu de força-motriz para a sua criação artística era declarada a mais nova capital do Brasil. E se hoje estivesse vivo, do que ele falaria?
Talvez falasse de amor, teria continuado a investigar quem inventou o amor, pedido mais explicações. Talvez continuaria a divagar sobre a violência, que é tão fascinante e as nossas vidas, que são tão normais. Talvez o sexo verbal, que não fazia o seu estilo, teria dado lugar ao sexo virtual – e as palavras, que são erros, estariam ainda mais erradas, desconsertadas pelas abreviaturas cibernéticas da geração Coca-cola que persiste e ainda existe.
Se Renato ainda estivesse vivo, narraria a morte de Maria Cláudia e de João Hélio, como fez com João Alberto, o maioral, o cara legal? Talvez. E talvez também daria sequência e continuaria a divagar sobre que país é esse. Será que se Russo estivesse vivo, aprofundaria a certeza de que há tempos nem os santos têm ao certo a medida da maldade? O que diria o poeta, ao assistir às conseqüências transformadas em invasões daqueles forasteiros que só queriam falar com o presidente pra ajudar toda essa gente que só faz sofrer?
Provavelmente Renato Russo escreveria uma composição sobre o agora homem, antes apenas o filhinho do Eduardo, aquele que impediu a viagem de férias porque ficou de recuperação. Pode ser, também, que ele abandonasse a tônica agressiva quando dizia que iríamos comemorar como idiotas a cada fevereiro e feriado, e resolvesse gravar com Ivete Sangalo, e pulasse num trio. Bom, isso eu acho que não…
Nos 18 anos de atividade como cantor, intérprete, compositor e líder da (talvez) maior banda de rock brasileira que já existiu, a música de Russo passeava pelo que havia de mais introspecto nele próprio, ao mesmo tempo em que revelava as melhores verdades sobre as décadas de 80 e 90, em parte narrando o cotidiano dessa Brasília, separada de seu nascimento por apenas 25 dias.
Mas nada vai conseguir mudar o que ficou. E se ficou como estava – e falo aqui da criação artística de Renato Russo – e ainda consegue despertar amor, saudades, raiva e indignação, é porque o trovador (muitas vezes solitário) foi alçado a gênio. Afinal, gênios da música são aqueles que conseguem ser universais, mesmo falando de coisas locais; são aqueles que conseguem ser atemporais, mesmo que seus temas narrem o cotidiano presente.
Este sábado é de nostalgia nessa sempre ingrata Brasília, Renato. Permanece a mesma ingratidão do seu último show por aqui: bares sem homenagens, nenhum show previsto, e até mesmo a retirada de seu nome do Espaço Cultural da 508 Sul do site da Secretaria de Cultura. Não vou me preocupar, afinal, às vezes o que eu vejo quase ninguém vê. E eu sei que você sabe, quase sem querer, que eu vejo o mesmo que você.
Leia também:
Vai um refri aí? – texto nosso de julho de 2008 sobre o lançamento do CD póstumo “Trovador Solitário”
Velhos chiados românticos e uma saudade – também em julho de 2008, acompanhamos bate-papo com mãe e filho de Renato Russo
Entre amigos – ainda sobre esse bate-papo, também com um pouco sobre o monólogo sobre a vida de Renato.
Droperia Cultural – texto de julho do ano passado, sobre nossa mudança de nome para Droperia (sim isso ainda vai acontecer), e um pouco sobre a biografia do Renato Russo, por Carlos Marcelo.
GRITOS NA MULTIDÃO – texto meu e da Camila, ainda enquanto estudantes, de 06/10/2005 (está em .pdf, desatualizado. e releve erros e obviedades, ok?)
Morilo,
como você escreve bem… parabéns pelo texto, o blog está muito bom!!
grande beijo de fã
Grande Renato Russo, ele faz muita falta na música brasileira.
Beijos
bem, tu sabe que minha opinião sobre ele não é das melhores. mas claro que eu nunca desejei a morte de ninguém. é uma pena ele ter morrido. quem sabe, vivo, conseguiria me fazer gostar dele?
bela homenagem!