Quatro décadas atrás, os conceitos de ecologia e de defesa do meio ambiente, certamente, ainda não eram bem formulados. Poucos, naquela época, falavam nisso, aliás. Época em que o desenvolvimento avançava sobre os recursos naturais disponíveis sem maiores repercussões – tudo bem que ainda hoje a indústria está se fodendo para o meio ambiente, mas naquela época, ela (e a sociedade, de um modo geral) podia fazer o que fizesse: jamais haveria um grande escândalo ambiental em destaque nas páginas dos jornais. Claro, guardadas as excessões (como tudo, né?).

As empresas não faziam marketing vagabundo com mensagens de responsabilidade social, não havia sequer uma noção consolidada e difundida sobre consumo consciente. Mas foi de quatro décadas para agora que se soube que muitos animais eram sacrificados, na mata, para sustentar o luxo porco do homem urbano. Sacrificados a ponto de chegarem à beira da extinção, ou mesmo serem completamente exterminados. Tá, onde está a cultura, que é o que interessa neste site? Estaria eu virando um eco-chato? Não, essa introdução toda (que no jornalismo é chamada de nariz de cera e é abominada, mas eu adoro) serve de base para começar a falar de Ângela Leite.
Ela produz xilogravuras e desenhos os mais diversos, com temática bem definida e traço só dela: animais brasileiros são o foco do trabalho da artista. E o faz há pelo menos 40 anos. Quando ela começou, devia ser uma voz dissonante. Não havia essa onda “eco”, e portanto, não haviam eco-chatos. Explico: há gente bem intencionada, militante da causa ambiental, que desenvolve trabalhos louváveis, como Angela Leite, e gente pentelha, oportunista, que faz da causa ambiental um mote para aparecer – esses são os eco-chatos.
O que mais admiro num artista é sua capacidade de cuidar da forma de suas obras, sem esquecer do conteúdo. Há quem o faça criando um conceito, que delimite e delineie sua produção, e há quem milite em favor de uma causa e a transforme em arte. Ao ver uma xilogravura da artista, é possível que você apenas se atenha aos seus impressionismos estilísticos – essa relação é “pessoal e intransferível”, e à primeira vista, você determina se gosta ou não de determinada obra se é, para você, bela ou feia. Quando é apenas bela, mas não traz nenhum conceito ou conteúdo, torna-se estéril. Quando é feia, mas conceitual, carregada de significados políticos, pode até tornar-se linda. Recomendo ir além do impressionismo raso e se apaixonarás pela produção dela.
Aliás, as obras de Angela Leite, na minha opinião, não se inserem em nenhuma dessas duas situações de relação artista x público: elas são belíssimas (eu adoro xilogravura) e ricas da militância da artista eco-legal. Acaba de entrar na rede um site com boa parte de sua produção, tanto com a reprodução de suas xilogravuras, quanto de seus desenhos e textos, blog e mesmo produtos com reproduções de sua obra. Sensacional. Para ir nele, dedada aqui.